quarta-feira, janeiro 26, 2011

CRÓNICA DE BAPTISTAS BASTOS


Mário Soares foi o vencedor das eleições. A astúcia e a imaginação do velho estadista permitiram que Fernando Nobre, metáfora de uma humanidade sem ressentimento, lhe servisse às maravilhas para ajustar contas. É a maior jogada política dos últimos tempos. Um pouco maquiavélica. Mas nasce da radical satisfação que Mário Soares tem de si mesmo, e de não gostar de levar desaforo para casa. Removeu Alegre para os fojos e fez com que Cavaco deixasse de ser tema sem se transformar em problema. O algarvio regressa a Belém empurrado pelos acasos da fortuna, pelos equívocos da época, pelo cansaço generalizado dos portugueses e pelos desentendimentos das esquerdas (tomando esta definição com todas as precauções recomendáveis). Vai, também, um pouco sacudido pelo que do seu carácter foi revelado. Cavaco não possui o estofo de um Presidente, nem um estilo que o dissimulasse. Foi o pior primeiro-ministro e o mais inepto Chefe do Estado da democracia. Baço, desajeitado, inculto sem cura, preconceituoso, assaltado por pequenas vinganças e latentes ódios, ele é o representante típico de um Portugal rançoso, supersticioso e ignorante, que tarda em deixar a indolência preguiçosa. Nada fez para ser o que tem sido. Já o escrevi, e repito: foi um incidente à espera de acontecer. Na galeria de presidentes com que, até agora, fomos presenteados, apenas encontro um seu equivalente: Américo Tomás. E, como este, perigoso. Pode praticar malfeitorias? Não duvido. Sobre ser portador daqueles adornos é uma criatura desprovida de convicções, de ideologia, de grandeza e de compaixão. Recupero o lamento de Herculano: "Isto dá vontade de morrer!"

2 comentários:

Paixão Lima disse...

«Isto dá vontade de morrer !». lamenta Herculano. Eu digo «isto dá vontade de rir !». Subscrevo, na íntegra, a crónica do Escritor Baptista-Bastos. O presidente eleito pretende ser presidente de todos os portugueses, apesar de ter sido eleito,apenas, por 25% dos eleitores. Não é marinheiro como Américo Tomás mas é economista (de estatística). Mas o povo não é um conjunto de números amorfos, mas uma amálgama de sensações, de emoções e de paixões, sentimentos que não podem ser contabilizados. O portugueses têm aquilo que merecem.
Um beijo.

SOL da Esteva disse...

DAD

Subscrevo o Coment de PL e torno, também, minhas as suas palavras.

Apenas o remate final: os Portugueses merecem melhor que aquilo que por aí anda na política; mas os capazes (que os há) ou não se atrevem ou são cilindrados pelos "enraizados" no sistema.

Beijo
SOL