sexta-feira, março 28, 2008

Aprendizagem urgente



"O que me preocupa,
não é o grito dos violentos,
nem dos corruptos,
nem dos desonestos,
nem dos sem carácter,
nem dos sem ética...

O que mais me preocupa,
é o silêncio dos bons!"
Martin Luther King

quinta-feira, março 27, 2008

Hoje à tarde, em Lisboa...


Hoje ao deambular por Lisboa, percorri ruas
onde existiam as tabacarias pessoanas
e recordei-o...
Aqui e agora o relembro
com um poema que foi muito
importante para mim,
Dad

A TABACARIA
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real,
certa, desconhecidamente certa,
com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a pôr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.

Estou hoje perplexo como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua,
como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho,
como coisa real por dentro.

Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa,
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.

Saio da janela, sento-me numa cadeira.
Em que hei-de pensar?
Que sei eu do que serei,
eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso ser tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!

Génio?
Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho génios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?,
nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.

Não, não creio em mim.
Em todos os manicómios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim... Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora génios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas,

-Sim,verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
e não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.

Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela; Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.

Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chuva, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.

Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistámos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordámos e ele é opaco,
Levantámo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.

(Come chocolates, pequena;come chocolates!)
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folhas de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, sem rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.
(Tu, que consolas, que não existes e por isso consolas,)
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -,
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos
invoco a mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.
Vivi, estudei, amei, e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira, E penso:
talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente.
Fiz de mim o que não soube,
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.

Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-te como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.

Mas o dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olhou-o com o desconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, e eu deixarei versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, e os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas
qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos
e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,

Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.

Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?),
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é
uma consequência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira.
Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria
(metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o: é o Esteves sem metafísica.
(O dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus gritei-lhe
Adeus ó Esteves!,
e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança,
e o dono da Tabacaria sorriu.
Álvaro de Campos
(Fernando Pessoa)
(15-1-1928)

quarta-feira, março 19, 2008

CURIOSIDADES...


Porque é que a Pascoa é tão cedo este ano?
A Páscoa é sempre o primeiro Domingo depois da primeira lua cheia depois do equinócio de Primavera (20 de Março). Esta datação da Páscoa baseia-se no calendário lunar que o povo hebreu usava para identificar a Páscoa judaica, razão pela qual a Páscoa é uma festa móvel no calendário romano.
Este ano a Páscoa acontece mais cedo do que qualquer um de nós irá ver alguma vez na sua vida! E só os mais velhos da nossa população viram alguma vez uma Páscoa tão temporã (mais velhos do que 95 anos!).
1) A próxima vez que a Páscoa vai ser tão cedo como este ano (23 de Março) será no ano 2228 (daqui a 220 anos). A última vez que a Páscoa foi assim cedo foi em 1913.
2) Na próxima vez que a Páscoa for um dia mais cedo, 22 de Março, será no ano 2285 (daqui a 277 anos). A última vez que foi em 22 de Março foi em 1818. Por isso, ninguém que esteja vivo hoje, viu ou irá ver uma Páscoa mais cedo do que a deste ano.

sexta-feira, março 07, 2008

Para ler e pensar bem sobre o assunto...


O Dia da Mulher é amanhã, ou deveria ser todos os dias?
Dad

Mais de um quarto das mulheres portuguesas são inteiramente dependentes do rendimento dos seus companheiros, de acordo com um estudo da Universidade de Coimbra (UC) que avaliou a dependência da população feminina.

Realizado pelo Centro de Estudos Sociais da UC em 2006, a pesquisa baseou-se na análise do Inquérito ao Rendimento das Famílias do Instituto Nacional de Estatística (INE), sendo, por isso, representativo da população portuguesa.
Em declarações à agência Lusa na véspera do Dia Internacional da Mulher, Lina Coelho, autora do estudo, considerou que a tendência de longo prazo aponta para uma diminuição do número de mulheres dependentes, mas sublinhou que, nos últimos anos, não tem havido uma redução.
«Há cada vez mais mulheres a desejar e a concretizar o desejo de ter uma actividade remunerada. Contudo, tendo em conta a crise económica dos últimos três ou quatro anos, há o risco de desaceleração da melhoria da situação económica das mulheres», afirmou a investigadora, adiantando que o aumento do desemprego está a afectar mais as mulheres do que os homens.
Segundo dados do INE relativos a 2007, mais de 2,8 milhões de mulheres portuguesas encontram-se inactivas, um número que não abrange as desempregadas. Quase dez por cento (225 mil) têm entre 25 e 44 anos.
Do total de inactivas (um conceito que inclui estudantes, domésticas e reformadas), mais de meio milhão são donas de casa. No entanto, entre as que trabalham também podem existir casos de dependência económica parcial relativamente aos companheiros, uma vez que continuam a registar-se discrepâncias acentuadas no rendimento médio mensal de mulheres e homens.
Os dados do INE referentes ao ano passado revelam que eles ganham, em média, mais 137 euros do que elas, uma diferença que aumenta com a qualificação profissional. Entre os quadros superiores da Administração Pública e dirigentes de empresas, as mulheres ganham, em média, 1396 euros, menos 345 do que os colegas do sexo masculino.
Já nas profissões intelectuais e científicas, elas são penalizadas em 296 euros. Quando se trata de trabalho não qualificado, a diferença fica-se pelos 134 euros, em média. Embora tenha vencimentos mais baixos, a população feminina é mais qualificada: no último trimestre de 2007, mais de 430 mil mulheres com formação superior estavam integradas no mercado de trabalho, para apenas 311 mil homens.
«Apesar da maior qualificação das mulheres, as diferenças salariais têm tido tendência a manter-se no tempo, sendo uma realidade muito mais marcante no sector privado. Não vejo perspectivas de que se estejam a esbater», afirma Lina Coelho.
Para a investigadora da Universidade de Coimbra, o facto de as mulheres continuarem a assegurar quase em exclusivo as tarefas de apoio à família faz com que sejam «mais ausentes do trabalho e que tenham mais quebras na sua prestação», o que acarreta «custos para os empregadores e se reflecte no salário».
Por semana, os homens estão no emprego, em média, 37 horas, mais quatro do que as suas colegas, segundo estatísticas do INE. Entre os que passam mais horas no local de trabalho (41 ou mais), quase 600 mil são homens e pouco mais de 280 mil são mulheres.
«Seria preciso que a sociedade no seu todo mudasse bastante, com uma partilha efectiva de tarefas domésticas e familiares, para esbater a diferença a nível salarial e de disponibilidade para o trabalho», comentou a investigadora da Faculdade de Economia de Coimbra.
Actualmente, mais de metade das tarefas domésticas continuam a ser realizadas exclusivamente pelas mulheres, sem ajuda dos maridos ou companheiros, que desempenham sozinhos apenas 17 por cento dos trabalhos em casa, de acordo com um estudo do Instituto de Ciências Sociais, divulgado em Setembro do ano passado. «A sociedade teria de arranjar formas de compensar os empresários para suportarem os custos adicionais de contratar mulheres», concluiu
Lina Coelho.
Lusa/SOL

sábado, março 01, 2008

De súbito, as luzes apagam;
A música irrompe;
A cortina abre...
O Homem... ali...
Um homem que gostava da Primavera
e do cheiro dos campos floridos.
Uma secretária fria,
um tinteiro e uma caneta
e livros incontáveis de folhas em branco
para escrever e
vários carimbos, muitos...
que a vida de cada um de nós é feita de carimbos.
E a miséria, a distância, a falta de amor,a doença, a incompreensão
com que se matam aqueles que não conseguem alinhar completamente
pelo politicamente correcto.
Um homem, uma família em perda, uma alma sofrida
e o sistema - o Big Brother que nos controla a todos
e nos corrói a alma.
Finalmente o Amigo - o Amigo!
aquele que ouve e compreende; o Amigo que
não precisa de fazer perguntas para ajudar;
o Amigo que está ali, pé firme para o que der e vier...
e ANGÚSTIA sempre presente...
O SISTEMA a controlar,
O SISTEMA a exigir,
O SISTEMA a condenar,
O SISTEMA a aniquilar!
E um único Amigo!
Amigo que acaba por sucumbir ao Sistema!
UM HOMEM ABSOLUTAMENTE SÓ
IRREMEDIAVELMENTE SÓ !
E as ilusões perdidas - do futuro, da família, do trabalho,
da subsistência, do amor, do companheirismo...
Só resta o AMIGO
que finalmente reencontra, fora do espaço e do tempo,
num espaço e num tempo onde já não há necessidade
de sentir o perfume das flores às escondidas
porque não há ninguem a controlar.
Num tempo em que é tempo de ir ver o mar
que nunca tinha sido possível ver...
e viajar pela liberdade, como se fosse um pássaro...
Não vou escrever mais sobre a peça que está em cena e que estreou
ontem no Teatro Lurdes Norberto, em Linda-a-Velha, com a encenação
magistral do meu amigo Armando Caldas.
Ontem não contive as lágrimas muitas vezes.
Acho que todos nós nos revemos um pouco no
Senhor Crock
a personagem central da peça "O TINTEIRO"
da autoria do autor espanhol Carlos Muñiz.
Todos nos sentimos, uns mais do que outros, encurralados
nesta Sociedade feita para humanos, com regras desumanas.
O Big Brother espia os nossos actos e na nossa vida.
Quantas vezes já sentimos que não somos capazes de carregar o fardo
que não somos compreendidos e nos refugiamos, simplesmente
na esperança de um destino final
lindo e libertador?
Ontem senti-me Crock algumas vezes
e chorei, não sei se por mim se pelo sistema
que construimos e que, no entanto, não
consegue fazer felizes a grande maioria dos cidadãos...
mas isso são outros contos...
VÃO AO TEATRO DE LINDA A VELHA
VÃO VER O "TINTEIRO"
Vão ver que vão sair de lá mais conscientes
do vosso papel como homens e mulheres.
Não tenham medo de chorar como eu
porque isso é bem humano.
E não se esqueçam de agradecer ao Armando Caldas
e a todos os Artistas, o excelente espectáculo
que nos proporcionam e que nos ajuda a
lembrar que continuamos a ter que
lutar contra tudo aquilo
que pode matar a dignidade humana!
Abraço para todos!
Dad