segunda-feira, agosto 15, 2005

VIVER NÃO DÓI



Definitivo, como tudo o que é simples. A nossa dor não advém das coisas vividas, mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram.

Por que sofremos tanto por amor? O certo seria a gente não sofrer, apenas agradecer por termos conhecido uma pessoa tão especial que gerou em nós um sentimento intenso e que nos fez companhia por um tempo razoável, um tempo feliz. Sofremos por quê? Porque automaticamente esquecemos o que foi desfrutado e passamos a sofrer pelas nossas projecções irrealizadas, por todas as cidades que gostaríamos de ter conhecido ao lado do nosso amor e não conhecemos, por todos os filhos que gostaríamos de ter tido junto e não tivemos, por todos os shows e livros e silêncios que gostaríamos de ter compartilhado, e não compartilhamos. Por todos os beijos cancelados, pela eternidade.
Sofremos não porque o nosso trabalho é desgastante e mal pago, mas por todas as horas livres que deixamos de ter para ir ao cinema, para conversar com um amigo, para nadar, para namorar. Sofremos não porque a nossa mãe é impaciente connosco, mas por todos os momentos em que poderíamos estar trocando confidencias com ela as nossas mais profundas angústias se ela estivesse interessada em nos compreender. Sofremos não porque a nossa equipa perdeu, mas pela euforia sufocada. Sofremos não porque envelhecemos, mas porque o futuro está sendo confiscado de nós, impedindo assim que mil aventuras nos aconteçam, todas aquelas com as quais sonhámos e nunca chegámos a experimentar.

Como aliviar a dor do que não foi vivido? A resposta é simples como um verso: Iludindo-se menos e vivendo mais!!! A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, ao nos esquivarmos do sofrimento, perdemos também a felicidade. A dor é inevitável. O sofrimento é opcional.

Carlos Drummond de Andrade


1 comentário:

Anónimo disse...

O sofrimento é opcional e como foi Drummond que disse isso, uma coisa é certa: os poetas vêem com a luz de Deus. Passamos tempo demais vendo a porta que se fechou e esquecemos de uma outra, pertinho, que se escancarou ante nós.